
Se você tivesse que escolher entre uma prótese para sua perna e um intercâmbio. O que você faria?
Hoje, compartilhamos com vocês a história de Sirlene Ribeiro. Brasileira de 37 anos que por conta de um acidente trágico, quase perdeu as esperanças e a vontade de realizar o sonho de viver e estudar fora do Brasil.
Bom, à primeira vista ler o parágrafo acima pode parecer insensível ou apressado.
Mas a ideia é justamente te preparar para uma das histórias mais bonitas que já contamos por aqui, encare-o como uma sinopse do que está por vir.
Quando tinha 17 anos, Sirlene morava em Sumaré, cidade na região de Campinas e como qualquer outra adolescente nessa idade sonhava em conhecer o mundo e todas as belezas escondidas fora das fronteiras paulistas.
Mas eis que em abril de 1996, seus sonhos quase foram arruinados por um trágico acidente de moto:
Era um sábado como qualquer outro e, eu e um amigo decidimos dar uma volta de moto pelo bairro.
Fomos a casa de uma outra amiga e, na volta (aproximadamente umas 20h30 – lembro-me bem do horário, pois havia acabado de perguntar para ele) um carro que vinha na contramão nos acertou.
Segundo o motorista, ele não havia nos visto e foram milésimos de distração. Milésimos esses que mudaram minha vida pra sempre.
Apesar de meu amigo ter saído ileso do acidente e o motorista ter nos prestado socorro na hora, os danos em mim foram irreparáveis: perdi minha perna esquerda, e a partir de então, minha vida mudou completamente.
Imaginem vocês o impacto que um acidente desses pode ter na vida de uma jovem, aos seus 17 anos.
Pois bem, nada disso abalou Sirlene que mesmo com todas essas adversidades ainda arrumou forças para encarar uma faculdade de Letras e, quando percebeu que sua vida estava se tornando muito monótona, mudou-se de mala e cuia para o estado do Espírito Santo, onde morou por quase dois anos e percebeu que havia muita vida fora do estado de São Paulo.
Estava em um momento bem complicado da minha vida, onde me sentia muito frustrada e deprimida.
Precisando de algo que me movimentasse e desafiasse.
Foi aí que comecei a viajar sem parar, morei por quase dois anos no Espírito Santo e quando voltei pra casa, percebia que não pertencia mais aquele lugar.
Meus sonhos de adolescência voltavam a tona, eu queria conhecer o mundo.
A última empresa que trabalhei no Brasil, me deu uma prótese de presente por pura filantropia e até hoje sou muito grata a eles.
Mas após 1 ano e meio, meu corpo mudou muito e a prótese já não me servia mais.
Foi aí que tive que fazer a decisão da minha vida: Ou eu compraria uma prótese nova (já que no Brasil elas são muito caras) ou investiria meu dinheiro no meu sonho, e embarcaria para um intercâmbio!
Acredito que a essa altura, vocês já devam imaginar por qual decisão Sirlene optou, não é mesmo?
Eu já havia me acostumado e acomodado com minha posição na época.
Apesar dos desafios e preconceitos enfrentados por deficientes físicos no Brasil, eu sentia que precisava enfrentar um novo desafio, queria mudar de vida, extrapolar as barreiras nacionais, conhecer novos horizontes e vi no intercâmbio a oportunidade perfeita para isso.
Minhas primeiras opções eram EUA e Canadá, mas por conta da burocracia e de toda a preocupação pré-embarque desses países (aliados a minha pressa em sair do Brasil) acabei desconsiderando a ideia deles e voltando minhas atenções para o maior celeiro de línguas do mundo: a Europa.
Sirlene começou a pesquisar sobre o Velho Continente, o tratado de Schegen e também quais os países que falavam inglês por lá.
Ela disse ter acessado também um site chamado WAYN (Where are you now) que tem por objetivo conectar pessoas ao redor do mundo, onde ela fez diversas amizades e conheceu Martin – grave esse nome pois ele é peça importante nessa história – um dinamarquês que vive na Irlanda, e compartilhou tudo o que conhecia sobre o país com Sirlene.
Eis então que poucos meses depois ela embarcava, primeiro para umas férias de 13 dias, para a Irlanda. Onde conheceu Martin pessoalmente e também um pouco sobre o país, antes de se mudar definitivamente:
Quando cheguei na Irlanda, foi amor à primeira vista. Seus olhos azuis e seu jeito meio “viking”, aliados a forma como ele me tratava, me deixaram sem reação.
Mas percebia que precisava (e muito) melhorar meu inglês para me comunicar com ele, foi aí que decidi que a Irlanda seria o destino do meu intercâmbio, e no ano de 2016 eu desembarcava novamente na Ilha Esmeralda, mas agora com sonhos e planos bem maiores.
Como nada na vida dessa guerreira foi fácil, quando chegou na Irlanda, o sonho por pouco não se tornava um pesadelo em pouco tempo.
O começo do meu intercâmbio não foi nada fácil. Fiquei muito perdida na primeira semana, pois tinha que encontrar por conta própria um lugar para morar e estava muito difícil de achar.
Dublin é um lugar que chove muito e por conta das minhas limitações físicas, não podia me dar ao luxo de morar longe – e as leis para deficientes físicos por aqui são bem diferentes das que temos no Brasil.
Por exemplo, não há fila preferencial para nós. Parece absurdo né? Para eles, não.
Quando encontrei um local para morar, ficava há alguns minutos da escola e parecia perfeito. Só parecia.
Tinha de subir e descer quatro andares pela escada e dividia o quarto com duas pessoas, no quarto um beliche e uma cama de solteiro, adivinha onde eu ficava? Sim, na parte de cima da beliche.
Certo que todas pagávamos os mesmos valores pela casa e nenhuma tinha direito a mais do que a outra na casa.
E como cheguei por último, não tinha muito o que escolher também, mas né? Um pouco de compaixão não fazia mal a ninguém.
Na primeira vez que estive na casa e percebi que ficaria de fato na cama de cima, pedi para que as meninas saíssem do quarto para que eu tentasse subir sozinha pois me sentia constrangida em ter que tentar fazer aquilo na frente de alguém.
Consegui vitoriosa subir pela primeira vez, mas devo dizer que era muito trabalhoso e difícil.
Nunca vitimizei de nenhuma forma minha condição, mas a situação que me forçavam a encontrar era realmente muito complicada e delicada.
Sempre fiz os afazeres domésticos, desde que morava no Brasil. Mas sempre existiam coisas que eu simplesmente não tinha como fazer, como por exemplo, carregar um saco de lixo escada abaixo.
Bom, ninguém da casa se solidarizava ou se manifestava em prol de ajudar, caso eu não fosse insistente e pedisse repetidas vezes para alguém em específico, meu namorado quando me visitava (pois ainda não morávamos juntos) me ajudava com isso que, inclusive se tornou motivo para quererem que eu saísse ou ficarem fazendo gracinha com a situação.
Era complicado, mas serviu de aprendizado.
Apesar das adversidades e dos problemas iniciais, Sirlene superou tudo e hoje vive – quase que literalmente – uma lua de mel com seu intercâmbio e também com Martin.
Hoje vivo numa terra que eu já queria morar mas não sabia que existia, que trouxe paz e me ajudou a me aceitar e encontrar ainda mais.
Tenho a segurança que antes não tinha, estou aprendendo cada dia mais o tão sonhado segundo idioma e ainda encontrei o amor da minha vida.
Moramos juntos hoje, meu guia e amigo virtual se tornou a pessoa com quem mais posso contar desde que saí do Brasil e temos planos muito grandes para nosso futuro juntos.
Para encerrar essa publicação, fiz a seguinte pergunta para a Sirlene: se pudesse dar um conselho para pessoas que se encontram na mesma situação que você, qual seria?
Se você não tentar, nunca vai saber. Seja forte sempre. Mente negativa atrai coisa negativa. Pense positivo, siga seu coração.
Dificuldades haverão em qualquer lugar do mundo, você é o único representante do seu sonho na face da terra.
Se isso não for motivo o suficiente para te incentivar a correr atrás dele, eu não sei o que vai ser.